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Outro olhar

Eles reuniram fotos com nos muros pintados para estimular as pessoas a olhar em volta para ver o que a cidade está falando

Por Vinicius Felix
Atualização:

Você já reparou no que dizem os muros da cidade? Um advogado e uma publicitária criaram um manifesto e resolveram reunir fotos com frases pintadas para estimular as pessoas a olhar em volta para ver, afinal, o que é que a cidade está falando

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SÃO PAULO - O advogado Eduardo Perazza e a publicitária Gabriela Serio nunca fizeram um grafite ou uma pichação na vida, mas são dois apaixonados pela arte de rua. Um dia resolveram reunir as imagens e frases marcantes que encontravam nos muros de São Paulo em uma página na internet. Virou o projeto Olhe os Muros, que, desde que foi criado, há dois anos, tem revelado uma nova visão sobre a cidade e sobre as mensagens espalhadas ao redor de todos, mas que são quase imperceptíveis com a pressa diária.

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Perazza e Gabriela se conheceram pela internet. Um amigo em comum da dupla contou a Perazza que uma amiga fazia um blog muito bom e que ele deveria olhar o que ela escrevia. Os textos lembravam os que ele mesmo mantinha em seu blog pessoal. Eduardo foi atrás da dica do amigo e gostou. Comentou em alguns posts e começou a seguir Gabriela no Twitter. Com o tempo viraram amigos e passaram a se encontrar.

Cerca de seis meses depois, os dois conversavam sobre grafite e trânsito. Na conversa, acharam um ponto em comum. Ambos tinha gostado da frase “Você é escravo do Trânsito”, que viram pichada na Avenida Faria Lima, em São Paulo. O conteúdo mexeu com os dois e foi o ponto de partida do projeto.

A vontade de compartilhar frases semelhantes originou o Twitter @olheosmuros em 2009. “Queríamos fazer que as pessoas olhassem a cidade como nós olhamos. Tirá-las do piloto automático, da rotina que não faz você perceber que tem uma coisa diferente ali”, diz Gabriela.

Na conta, eles compartilhavam a frase e o endereço do muro, para que as pessoas pudessem encontrá-la. O perfil do Twitter caminhou devagar, mas isso não foi motivo de desânimo. “Ter 300 seguidores era o máximo para gente”, diz Perazza.

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A história tomou um novo rumo em 2010, quando Perazza foi para Londres fazer um mestrado e descobriu o Tumblr. “Vi que nós poderíamos divulgar muito melhor naquela ferramenta”, diz. A aposta funcionou bem. Em 2011, a página já havia alcançado 10 mil seguidores. Hoje são mais de 40 mil. No ano passado, decidiram criar uma página no Facebook. Lá, eles têm 20 mil fãs – e algumas imagens chegam a ter 600 compartilhamentos.

Gabriela guarda, sem exceção, todos os elogios das pessoas que acompanham o Olhe os Muros, por exemplo: “Agora andando na rua eu enxergo a arte nas paredes”; “Nem sei quantas vezes um muro já me deu respostas para problemas sociais ou existenciais”; e “Fui viajar e não conseguia parar de procurar arte nos muros”.

O material postado é em parte coletado por eles mesmos, que vão às ruas para fotografar, mas muitas imagens são enviadas por colaboradores, que ajudam em larga escala a produzir o conteúdo da página, com fotografias dos muros que encontram nas ruas. “Desde o começo a ideia era que fosse um coletivo”, diz Perazza.

São tantas imagens novas que os criadores têm de filtrar o conteúdo para publicar o que realmente tem valor. Em média, quatro imagens novas são publicadas por dia. E eles têm material suficiente para programar posts por 20 dias.

Imaginário popular

No Tumblr, o reduto central do projeto, a imagem mais compartilhada até hoje foi a de um muro com a frase “Eles não são você”,tirada em uma rua na Vila Mariana, em São Paulo. Foram mais de 25 mil compartilhamentos. A frase é uma das favoritas de Perazza. “Durante um momento da minha vida ela fez muito sentido. Era um momento de novas responsabilidades chegando e ela mexia demais comigo”, diz.

E o que mexe com os outros? Para Perazza, o sucesso do Tumblr está no fato de as pessoas procurarem exibir nas redes sociais os aspectos que elas mais gostam em sua personalidade.

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Um grafite que resume um sentimento comum é tiro certo para viralizar. “Quando envolve amor é batata. ‘O amor é importante, porra’, ‘Mais amor por favor’ e ‘Não existe amor em sp’. O imaginário popular movimenta as pessoas”, diz Perazza.

Ponto de encontro

Para deixar claro que o site não é apenas um reduto de imagens de arte de rua, Eduardo e Gabriela escreveram um manifesto. “A verdade é que os muros eram antigamente o que o Twitter é hoje em dia. Mídia social pura! De lambe-lambe a grafite, de stencil a intervenção urbana. Os muros sempre foram utilizados como meio de comunicação, um instrumento para passar mensagens adiante”, diz o texto, que quer mostrar como arte pode reduzir a sensação de opressão da cidade.

A página também quer eliminar um dos principais aspectos do grafite: a efemeridade da obra, que some dos muros em pouco tempo. “Ainda mais em São Paulo, que cobre muitas das pinturas”, diz Eduardo.

Os dois amigos têm a intenção de transformar o site em um acervo eletrônico ou um museu digital de arte urbana, e também quebrar os limites entre online e offline, uma vez que a internet ajuda a ver a vida cotidiana de outra maneira.

Eduardo e Gabriela também sentiram os efeitos dessa transformação. Além da amizade dos dois, alguns seguidores do Olhe os Muros passaram a ser amigos pessoais da dupla e formaram um segundo grupo.

São pessoas completamente diferentes que se conheceram através do Twitter, mas que reunidos falam de outras coisas e fazem projetos diversos, como sarais e eventos artísticos. Nas palavras de Gabriela: “O muro é um ponto de encontro de várias pessoas diferentes que têm alguma coisa em comum e o nosso grupo funciona dessa maneira. As histórias combinam”.

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—-Leia mais:• Link no papel – 21/01/2013

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