Piratas à força

Estudo independente contrapõe pesquisas patrocinadas pela indústria e explica os motivos da pirataria

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Por Rafael Cabral
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Preços muito altos para a cultura, salários baixos e a disseminação de tecnologias baratas para trocar arquivos e queimar CDs e DVDs – essa é a combinação que faz dos países emergentes constantes destaques em listas dos mais piratas, afirma uma pesquisa conduzida ao longo de três anos pelo Social Science Research Council em parceria com o Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas.

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Buscando funcionar como um contraponto independente aos estudos patrocinados pela indústria, a pesquisa afasta a maioria dos piratas de ligações com o crime organizado e alega que a principal razão para a pirataria no mundo em desenvolvimento é antes de tudo econômica.

O relatório analisou os preços piratas e oficiais no Brasil, na Índia, na Rússia, na África do Sul, no México e na Bolívia e descobriu, por exemplo, que o Windows original chega a custar de cinco a dez vezes mais nesses países do que nos Estados Unidos ou na Europa. Os dados mostram que o DVD pirata no Brasil, ajustado ao poder de compra da população, custa US$ 20, bem perto do preço do oficial nos Estados Unidos (US$ 24). Já a versão legal, por aqui, custa três vezes mais do que lá.

“Basicamente, grandes multinacionais formulam preços para proteger mercados de alta renda. Eles preferem isso a expandir suas atividades em mercados de baixa renda como o do Brasil ou da África do Sul. E faz que eles virem piratas”, explica o sociólogo norte-americano Joe Karaganis, que chefiou o estudo. Para ele, a confusão entre pirataria e flexibilização é incentivada pelas leis desses países, que ainda não estão adaptadas à lógica de compartilhamento que veio com a internet.

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“As leis desses países lidam com a pirataria de larga escala e predominante física – como fábricas de DVDs piratas. É uma modalidade antiga de pirataria, e as legislações ainda não estão preparadas para as novas modalidades. Acredito que, no futuro, o enrijecimento das leis irá para capacidades básicas internet que favorecem a troca – copiar e repassar arquivos, linkar. Por isso o debate é cada vez mais delicado, porque toca em direitos como a liberdade de expressão e a privacidade”, preocupa-se.

O estudo dedica 86 páginas ao Brasil, remontando a construção da noção de direito de autor no país e explicando pontos recentes como os projetos de reforma da lei de copyright, do Marco Civil e até a polêmica Lei Azeredo, criticada pela tentativa de exigir a identificação dos internautas brasileiros.

O arquivo do Media Piracy in Emerging Economies está circulando sob uma nova forma de registro, chamada Consumer’s Dilemma ou Dilema do Consumidor. “Quisemos criar uma forma de distribuição que demonstrasse a nossa tese, mas invertendo quem paga a conta”, diz Joe Karaganis, chefe do projeto.

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Países desenvolvidos – Estados Unidos, Japão, Austrália, Israel e outros – têm de pagar US$ 8 para poder baixar o PDF. Já para entidades que arrecadam direitos autorais, o preço é US$ 2 mil, enquanto quem mora em países emergentes pode baixá-lo de graça. “Quisemos expor o dilema entre comprar o bem pelo preço legal, pirateá-lo – o que é muito fácil – ou ignorá-lo. Essa é a escolha que todo consumidor tem que fazer, todos os dias”.

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—- Leia mais:Link no papel – 21/03/2011ESPECIAL: Atlas mundial da piratariaQuem tem medo da mudança?“Não vamos engavetar a reforma”“Quero consertar o que estraguei ao criar o Napster”

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