Piratas sem opção

Suíços criam manifesto Don't Make Me Steal, que define critérios para consumo de filmes em meios digitais

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Por Tatiana Mello Dias
Atualização:
Pierre Spring (esq) e Jordi Boggiano. FOTO: Divugalção  Foto: Estadão

Apesar do visual punk, Pierre Spring é um programador suíço casado, pai de dois filhos, tem um emprego fixo e uma vida normal. Só que assim como milhões de pessoas no mundo, Spring está na ilegalidade: ele baixa filmes na web sem pagar. E se frustra com isso.

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Foi esse sentimento que o fez começar a pensar em alternativas para o download ilegal. “Eu adoro filmes e gostaria de poder usar partes do meu salário para comprá-los ou alugá-los”, explica. E, pensando em maneiras para fazer isso, ele criou com o amigo programador Jordi Boggiano o manifesto Don’t Make Me Steal (não me faça roubar)”.

A proposta é simples: traça diretrizes básicas para a indústria do cinema oferecer seus produtos de maneira a estimular os consumidores a pagarem por conteúdo. Oito mil pessoas já assinaram o texto que parte do seguinte princípio: “Prometo que não irei piratear conteúdo em vídeo se houver uma alternativa legal”. Simples assim.

“Pessoalmente quero pagar pelos filmes, já que essa é a única maneira de mostrar apoio e sustentar as pessoas que criaram aqueles trabalhos. É uma pena que ficou muito mais fácil piratear filmes do que obtê-los legalmente”, diz Spring. Ele exemplifica: “Hoje nós estamos habituados à possibilidade de baixar um filme antes que ele chegue aos cinemas, e em alta qualidade. Às vezes, com legendas. Não há maneira de fazer isso legalmente”.

Os critérios do manifesto foram estabelecidos durante uma conferência. Vinte pessoas se sentaram à mesa para discutir: o que é preciso para que as pessoas voltam a gastar dinheiro com filmes? Assim foram estabelecidos padrões a serem adotados, que estimulariam as pessoas a pagar em vez de “roubar” o conteúdo.

Segundo os pontos, os filmes deveriam custar, no máximo, o valor cobrado por uma entrada de cinema. Assim que for efetuada a compra, o conteúdo deverá estar disponível imediatamente – e sem qualquer tipo de aviso inoportuno como anúncios ou propagandas antipirataria. O manifesto também prevê que os usuários possam baixar “praticamente qualquer filme já feito” e que as datas de lançamento dos filmes sejam mundiais.

“Os produtores de conteúdo esperam que nós saiamos de casa, caminhemos até a locadora para pegar o filme que queremos assistir. Na maior parte das vezes você não acha o filme que quer, ou ele não foi lançado na parte do mundo em que você vive. Isso fica ainda pior quando você tenta achar um filme no iTunes aqui na Suíça. Tudo o que você consegue são versões dubladas de filmes que foram lançadas há dois anos”, diz Spring.

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Apesar das milhares de assinaturas, por enquanto ninguém da indústria cinematográfica entrou em contato com os programadores. Spring acredita que serão necessárias pelo menos 200 mil assinaturas para que o manifesto seja levado em consideração pelas grandes produtoras de cinema.

Encontro. Por enquanto, além das assinaturas, o manifesto já rendeu uma reunião com Eric Walter, secretário-geral da equipe anti-pirataria da França e um dos responsáveis pela Lei Hadopi.

Spring e Boggiano devem ser encontrar com ele em breve para discutir o tema – a legislação francesa é considerada uma das mais duras no mundo no combate à pirataria. Ela prevê o corte da conexão de quem for pego consumindo conteúdo baixado ilegalmente. “Eu acho que esse é um sinal muito positivo”, diz Spring.

“Olhe o que aconteceu com a indústria da música. As pessoas se organizaram na internet para encontrar e distribuir as músicas que queriam. O Napster foi um grande sucesso porque ele se adaptou às necessidades dos amantes de música. E assim que a indústria estiver apta a oferecer um serviço que funcione como ele, as pessoas começarão a pagar por isso. Acho que o mesmo vale para os filmes”, diz Spring.

“Enquanto houver uma necessidade, haverá pessoas tentando suprir isso. Enquanto a indústria do cinema ignorar as nossas necessidades, todos os esforços deles serão em vão. Eu acho que a indústria do cinema vê os piratas como inimigos, em vez de vê-los como realmente são: pessoas que amam filmes e consumidores em potencial.”

—- Leia mais:Link no Papel – 21/02/2011

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