Por que a Amazon vai dar livros de graça?

Estratégia é semelhante à da Microsoft quando empurrou o Internet Explorer no Windows

PUBLICIDADE

Por Redação Link
Atualização:
 

Hoje, a Amazon revelou um plano radical: a Kindle Lending Library (biblioteca de empréstimos do Kindle).

PUBLICIDADE

O usuário ganha o direito de baixar um livro por mês para o Kindle, sem data de devolução, gratuitamente, desde que seja membro do serviço Amazon Prime e proprietário de um Kindle.

Espere um minuto, o que está havendo?

Para começo de conversa, o Amazon Prime foi lançado originalmente como um serviço de frete gratuito. Por US$ 80 ao ano, o consumidor ganhava um serviço gratuito de entregas que levava ao seu endereço em dois dias úteis tudo aquilo que ele comprasse na Amazon. Acho que a proposta devia ser boa para aqueles que compravam o bastante para fazer a taxa valer a pena.

Mas foi então que algo muito estranho ocorreu. A Amazon decidiu concorrer com o serviço de filmes via streaming da Netflix. A rede varejista começou a licenciar um número cada vez maior de filmes e programas de TV — são agora 13 mil deles, um número que se aproxima rapidamente do acervo da Netflix. O preço? Grátis, para os assinantes do serviço Amazon Prime.

O que o frete gratuito tem a ver com o streaming de filmes? Não tenho ideia. Mas esta deve ter sido uma agradabilíssima surpresa para os consumidores que tinham se tornado assinantes do Prime.

E agora, isto: livros gratuitos, incluindo os títulos na lista de best-sellers do New York Times, para o Kindle. Quer dizer, desde que o consumidor seja assinante do Amazon Prime.

Publicidade

Frete gratuito, filmes gratuitos, livros gratuitos, por US$ 80 ao ano. Qual é, exatamente, o plano da Amazon?

Deve haver algum tipo de plano mestre, pois a Amazon está gastando os tubos para fazer a ideia dar certo. Como a oferta se limita aos proprietários do Kindle — não funciona se usarmos o serviço Kindle num iPad, por exemplo –, o objetivo é vender mais Kindles.

Obviamente, as editoras de livros, conhecidas pelo medo que sentem do formato eletrônico, não teriam aceitado a oferta de livros gratuitos da Amazon sem receber garantias expressivas — e muito dinheiro. Como seria de se esperar, a Amazon diz que estes livros gratuitos para o Kindle não são de fato gratuitos. A empresa está pagando às editoras pelo direito de distribuí-los.

“Os títulos na Biblioteca de Empréstimos dos proprietários do Kindle vêm de uma série de editoras e são oferecidos de acordo com uma variedade de termos de uso”, diz a Amazon. “Em relação à grande maioria dos títulos, a Amazon chegou a um acordo com as editoras para incluir as obras no programa por uma taxa fixa. Em certos casos, a Amazon compra um livro cada vez que o título é emprestado por um leitor, pagando às editoras o preço total do varejo e sem oferecer a elas nenhum tipo de risco para demonstrar-lhes a oportunidade de crescimento — e lucro — incremental que este novo serviço representa.”

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Uau. A Amazon está mesmo comprando e-books para oferecer gratuitamente aos consumidores.

Espere um minuto. Isto me lembra alguma coisa — já ouvi este plano de negócios antes. Ah, é mesmo, já sei onde foi. Trata-se do mesmo plano que a Amazon tem para o seu novo rival do iPad, o Kindle Fire. (O aparelho será lançado ainda este mês, e logo publicarei uma resenha a seu respeito.) O Kindle Fire conta com todos os tipos de recursos interessantes; consiste basicamente num tablet para o consumo de tudo aquilo que é vendido pela Amazon: livros, música, programas de TV, filmes. Mas o melhor dos seus recursos é, de longe, o preço baixo: US$ 200. Compra-se um aparelho com 80% da funcionalidade de um iPad, por 40% do preço do produto da Apple.

Ora, todos sabem o quanto custam os tablets, independentemente da sua fabricante: o preço começa em US$ 500. A Amazon deve ter prejuízos ao vender o Fire a este preço, conseguindo assim fazer com que um maior número de pessoas compre livros, músicas, programas de TV e filmes. Eles estão oferecendo o aparelho de barba de graça e vendendo muito mais lâminas de barbear.

Publicidade

Seria fascinante dar uma olhada na planilha eletrônica com os detalhes do plano, não acha?

Isto me lembra de quando a Microsoft deu cabo do Netscape Navigator nos primeiros dias da web ao lançar um navegador rival, o Internet Explorer, oferecendo-o gratuitamente. Ganhando com a perda, num sentido grandioso e digital.

Em altaLink
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

A diferença é que ninguém parece se importar com o fato de a Amazon estar se inspirando neste plano: a empresa está usando seu substancial fluxo de caixa para dar aos consumidores uma série de brindes gratuitos, na esperança de gerar um fluxo de caixa ainda maior.

Na época, a Microsoft foi encarada como maligna e manipuladora — mas, até o momento, a Amazon ainda é tida como uma empresa boa e querida. Ela não se tornou uma participante nas guerras religiosas que ardem entre os fãs da Apple, do Google e da Microsoft. E não destruiu a si mesma por meio de estranhas decisões corporativas, como fez a Netflix.

Ora, é claro que a biblioteca do Amazon Kindle não conta com todos os livros do mundo. O acervo inicial é de 5 mil títulos, embora haja muitas obras boas dentre eles: a trilogia Jogos Vorazes, Fast Food Nation, Os Sete Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes, Moneyball, Liar’s Poker, Kitchen Confidential, Água para Elefantes, e assim por diante. Pode-se escolher um livro por vez. Todas as anotações e marcações do usuário são salvas para o caso de ele comprar o livro ou tomá-lo emprestado outra vez.

Loucura, não?

Não sei ao certo o que o frete gratuito tem a ver com filmes gratuitos e agora livros gratuitos. Não sei ao certo por que as pessoas não estão suspeitando de uma imensa corporação que decide oferecer produtos de graça; a sensação é a de que é tudo “bom demais para ser verdade”.

Publicidade

O que sei é que o Amazon Prime está parecendo ser uma oferta melhor a cada dia que passa. Na verdade, a proposta é quase irresistível.

E sei também o seguinte: a Amazon está investindo em ideias que não estão nos manuais convencionais da administração. Ideias realmente originais. E temos de aplaudir aqueles que chegam para agitar um pouco as coisas.

* Post publicado originalmente em 03/11/2011.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.