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Sem querer

A internet pode transformar anônimos em celebridades. Mas o que acontece com eles depois que o sucesso acaba?

Por Vinicius Felix
Atualização:

A internet pode transformar anônimos em celebridades. Mas e se a pessoa não quiser isso?

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SÃO PAULO – No dia 17 de agosto deste ano um menino de 13 anos tornou-se hit na internet. Um vídeo produzido para o seu Bar Mitzvah, em que ele dubla uma paródia da música “What Makes You Beautiful”, da banda One Direction, apareceu em blogs de humor e se espalhou rápido pela redes sociais. Publicado no YouTube pela própria família, o vídeo foi feito para ser visto por um círculo pequeno de parentes e amigos. Mas logo alcançou mais de 3 milhões de visualizações.

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 Foto:

Com o susto da repercussão, o vídeo original, a pedido da família, saiu do ar ainda naquele dia, mas era tarde. As imagens do menino Nissim Ourfali sobre uma baleia, em referência à praia de mesmo nome no litoral norte de São Paulo, já estavam foram de controle. Vídeos remixando a música, um suposto briefing da produtora do vídeo e variações de memes conhecidos brincando com o clipe circularam com grande repercussão.

“As pessoas gostam de rir. É natural que memes sejam usualmente ligados a bobagens, como fotomontagens do Serra em cima de um skate ou dos ingressos em promoção da Lady Gaga, e se alastram rapidamente”, diz Alexandre Inagaki, consultor de comunicação em mídias digitais. “Às vezes a piada que começa a aparecer de manhã já perdeu a graça à tarde, e é rapidamente substituída por outra webcelebridade instantânea do momento.”

Cerca de um mês depois de o vídeo fazer sucesso na internet, a família entrou com um processo contra o Google para que as referências a ele fossem retiradas. O blog Não Salvo, uma das diversas páginas que recomendaram o clipe, também recebeu uma notificação. Maurício Cid, responsável pelo site, preferiu não comentar o caso.

Na primeira decisão, a Justiça reconheceu que seria tecnicamente impossível apagar todas as referências ao vídeo. Mas a defesa da família recorreu, e uma liminar foi concedida obrigando o Google a retirar o vídeo, sob o risco de ser multado por cada dia que a decisão não fosse cumprida. A liminar contra a empresa lembrou o caso recente do vídeo que criticava um candidato à prefeitura de Campo Grande (MS), que terminou com o presidente do Google no Brasil Fábio Coelho detido por descumprir uma ordem judicial de remoção de conteúdo.

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O Link procurou os advogados da família do garoto, mas eles não se pronunciaram alegando que o caso tramita em segredo de justiça. A família também não comenta.

Fabiana Siviero, diretora jurídica do Google, minimiza o caso. Ela não considera a decisão um ponto negativo contra a liberdade de expressão. “Não há interesse público, não há discussão da parte política. A alegação é de um adolescente sofrendo constrangimento. A partir da ordem judicial, vamos tirar o que for pedido.” De acordo com Fabiana, as consequências da liminar foram a retiradas de três URLs.

Dessa maneira, até o fechamento desta edição, ainda era possível encontrar o vídeo no YouTube, como em outros serviços, como Vimeo ou Dailymotion. Sendo pouco efetivo, o processo era necessário? Ou é um direito de todos ter todas as suas referências apagadas com facilidade? A lei brasileira é clara em afirmar que todo conteúdo difamatório deve ser obrigatoriamente apagado, mas já é claro que isso não funciona na prática. “É a expressão já conhecida: ‘internet não se esquece’. Não tem como remover algo que se torna viral como esse vídeo”, diz Bruno Magrani, pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas. Nessa situação, Inagaki considera que processar o Google “faz tanto sentido quanto dar socos em um carteiro porque ele lhe trouxe uma conta pra pagar”.

“Isso não é um problema do Google e sim da possibilidade de compartilhamento de conteúdo na web. O Google tem suas plataformas para isso, outras empresas têm serviços similares”, considera Fabiana, que acredita que a questão poderia ser resolvida com a compreensão das pessoas que a privacidade mudou e é preciso ter atenção com o material que publicam.

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“O recente caso dos estudantes que postaram fotos de suas provas do Enem no Instagram, e foram eliminados por isso, é a prova de que as pessoas ainda não têm noção das consequências de se compartilhar indiscriminadamente na internet”, diz Inagaki.

A ideia de que é um direito poder apagar tudo ao seu respeito na internet tem defensores. O professor do Oxford Internet Institute Viktor Mayer-Schönberger é um deles. Em Delete: The Virtue of Forgetting in the Digital Age ele mostra que a mudança do peso da memória graças à tecnologia tem consequências graves para a sociedade. No livro, o autor levanta um dado importante: nove em cada dez americanos querem o direito de poder exigir que empresas apaguem todas as suas informações. Para Viktor, um espaço como o Google limita a capacidade de se tomar decisões ou formar laços próximos com pessoas que se lembram menos – e também fornecem material para um julgamento para sempre fora de contexto.

—-Leia mais:Link no papel – 12/11/2012Meme acidental

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