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Vida Digital: PC Siqueira

O vlogueiro é uma das caras mais conhecidas da internet brasileira em 2010 e afirma que está negociando para ir para a TV

Por Fernando Martines
Atualização:

PC Siqueira abre a porta do seu apartamento como se recebesse um amigo. Não aparenta nervosismo – tem dado uma entrevista por semana –, mas também não parece ter cansado de receber entrevistadores em casa. Simpático na medida, oferece um café, vai para a cozinha e começa a preparar a bebida. “Com essa máquina é muito rápido, não dá trabalho nenhum. E é o melhor café do mundo!”. Presa por uma grade no canto da cozinha, pulando loucamente, está a buldogue Lola, coadjuvante do vlog do autor, Mas Poxa Vida, cujos vídeos foram assistidos mais de 45 milhões de vezes, fazendo de PC a principal sensação da internet brasileira em 2010.

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Tirando as enormes tatuagens nos braços, nada indica que o entrevistado é uma das caras mais conhecidas dos conectados do Brasil, o tipo de celebridade que, se antes era restrita a um público de nicho, hoje está cada vez mais ampla. E o formato vlog é decisivo neste sentido: num País educado pela televisão como o Brasil, não são posts em texto, fotos estilosas ou programas de áudio online que vão atingir a grande massa na rede.

Desde o fato da entrevista ter sido combinada diretamente com ele, sem o intermédio de assessores, passando por ele ter atendido a porta e ter ido fazer um café por conta própria: sob todos os aspectos ele é um cara comum. Com o detalhe de ser muito famoso – quando seus vídeos são vistos quase 50 milhões de vezes, há algo muito fora do normal. Eis o exemplo de celebridade mais humana que a internet propõe. PC prefere não andar de ônibus, pois sua fama já causou alguns tumultos. Mas anda de metrô e nem pensa em ter segurança. A toda hora é parado para tirar fotos e é reconhecido até mesmo por “garotões de balada”, como diz, em lojas de conveniência durante a madrugada. Mas segue a sua rotina de antes da fama, frequentando os mesmos lugares – padarias, cafés, supermercado – em que andava.

Cômodo. O cenários em que entrevista acontece é o quarto mais famoso do Brasil hoje. Ele senta-se em sua cama e, ao perceber que irá contar mais uma vez a mesma história, surge um traço quase imperceptível de tédio e frustração em sua expressão. “Já contei essa história muitas vezes mesmo”, responde com certo desânimo.

E começa a explicar como surgiu a ideia de um protagonizar um vídeo em que fala sobre os assuntos mais improváveis e aleatórios apenas conversando com a câmera. “É, cara, foi aquilo que eu já falei”, começa a explicar, entre o cansaço e o tédio de repetir sua história mais uma vez. Respira fundo e, no tom menos solene possível, como se estivesse conversando com um amigo sobre o novo game que está jogando, conta sua trajetória.

Antes da fama, PC era colorista de quadrinhos. Um dia, entediado em casa, ele e um primo resolveram fazer um vídeo, só de brincadeira. Tinha apenas 300 seguidores no Twitter e não achava que o filminho conseguisse uma audiência muito maior do que a lista de cadastrados em sua conta no site de microblogs. Só não esperava que sua cara de nerd clássico – óculos de aro grosso, olhar torto, voz fina, disposição para falar sobre qualquer assunto que desse na telha – fosse cair no gosto de alguns blogs de humor em vez de ir para o limbo dos vídeos pouco vistos no YouTube. E bastou que a brincadeira fosse parar nestes blogs para que a parca centena de espectadores iniciais pulassem para os milhares e, logo em seguida, centenas de milhares de visualizações.

“Quando o Bobagento e outros sites postaram, todo mundo começou a assistir. Dois meses depois, a MTV já estava atrás para passar alguns trechos”, lembra.

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Foi quando ele decidiu faturar com a brincadeira que fugiu de seu controle. “Não lembro se foi com 30, 40 ou 50 mil views, mas, quando se chega nessa marca, o Google manda um convite para você colocar o AdSense no canal. Era um teste. Se eles continuassem a fazer sucesso, eu receberia um convite de parceria – e assim todos os vídeos já seriam pré-aprovados e viriam com AdSense”, explica.

AdSense é o sistema de publicidade do Google. Você já deve ter visto pequenos anúncios, na maioria em forma de texto, que surgem sob alguns vídeos no YouTube. Funciona assim: a empresa coloca links patrocinados embutidos no vídeo e o autor ganha uma pequena porcentagem a cada exibição. E graças à audiência colossal de seu Mas Poxa Vida, o vlogueiro teve como largar seu emprego original e se dedicar exclusivamente aos vídeos.

Entre HQs e vídeos. “No começo, foi difícil, porque eu sempre pensei que meu negócio era pintar e não ficar fazendo vídeos. Trabalhar com quadrinhos sempre foi meu sonho e ter conseguido trabalhar como colorista me dava a sensação de desejo realizado”, lembra, antes de fazer uma pausa, se desculpar e cortar o próprio raciocínio, repetindo pessoalmente um cacoete do próprio vlog – “Não que seja grande coisa trabalhar com quadrinhos, tem muita gente que faz isso”. Entre HQ e vídeo, a compensação da autoria: “No vídeo, o corre é meu, é a minha cara, eu falo as minhas ideias e tem até pessoas que as ouvem. Eu estou agregando valor à minha existência.”

Passado o relato da história de seu vlog, PC fica mais à vontade e passa a opinar sobre outros assuntos – e parece se empolgar. O vlogueiro percorre as perguntas em um tom muito parecido com o que apresenta no YouTube: um misto de (pouco) desinteresse e (muito) desleixo, como se quisesse mostrar que nada do que está falando é para ser levado muito a sério – sem nunca soar arrogante. Ele garante que não atua em frente à câmera, apenas age naturalmente. “Só não falo como estou conversando com você, pois há uma câmera em minha frente e eu preciso ter uma certa postura”. Fica claro durante a entrevista que o cara do Mas Poxa Vida é o mesmo que está na minha frente. Não é um personagem. O PC Siqueira da web é mais viajandão, mais incisivo nas críticas e com uma certa ingenuidade para apontar obviedades bizarras do cotidiano – uma das marcas de seu vlog. Estas qualidades são mais brandas no PC offline.

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No entanto, ele considera que seu pioneirismo no formato e a fama que conseguiu o transformaram numa exceção entre os vlogueiros do futuro – acha que a tendência é que quem vier a partir de agora fará menos sucesso. “Eu acho que a era de grande ídolos já era. Vai ter um, sei lá. Agora as coisas funcionam num nível bem mais pessoal. Tem muita gente fazendo conteúdo e as pessoas cada vez mais vão se identificar em grupos menores com coisas mais específicas, ao invés uma enorme massa ter um gosto unificado. Você vai ter vários ídolos menores para menos gente e não apenas um ídolo enorme para todos. São as pessoas que elegem quem vai ser pop e não mais uma indústria que o faz de cima para baixo – claro que a indústria ainda consegue impor muitas coisas”.

Pergunto se ele trocaria a liberdade quase inacreditável de escolher como criar, roteirizar, editar e publicar seus vídeos onde e quando quiser (“É a liberdade que a internet dá”, PC simplifica) pela televisão. O vlogueiro diz que sim. “Se você não for um fantoche e puder emitir opiniões próprias, é ainda a forma mais explícita de se expressar”, opina antes de contar que já está negociando sua ida para a TV em 2011.

—- Leia mais:Link no Papel – 20/12/2010

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