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Dinheiro, pra que dinheiro?

Os sistemas financeiros locais – como o brasileiro – correm o risco de serem tão relevantes quanto o número de atores locais de classe global que contém. Aqui, eles são poucos.

Por Silvio Meira
Atualização:

A rede de caixas eletrônicos do Reino Unido erra, desde 2014, as previsões de saques que os britânicos fariam nos terminais (ATMs, em inglês). Todo ano, há bem menos saques do que o previsto. Esse ano, a estima-se que as retiradas cairão 10%. O pico do uso de dinheiro vivo para pagamentos lá foi em 2000, com 74% das transações. Em 2018, só 28%.

Na Suécia, só 19% do volume – e 2% do valor- das transações são feitas em dinheiro e o Banco Central de lá diz que a “última nota” será usada antes de 2030, talvez até 2025. Parece que não há caminho de volta para o dinheiro físico, que será trocado por algum virtual. O último relatório inglês sobre caixas eletrônicos é intitulado, saudosamente, “Preservando o Acesso a Dinheiro”, o que dá uma ideia da situação por lá.

Na China, cidadãos já migraram do papel moeda para pagamentos com QR Codes Foto: Reuters

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Observando o cenário pela ótica dos bancos, as transações digitais realizadas pelo próprio cliente, no Brasil, passaram todas as outras em 2015 e são, hoje, 60% do total – as agências são apenas 5% – e as transações digitais com movimentação financeira no móvel cresceram 15 vezes entre 2014 e 2018. Em proporção, o número de transações em ATMs, aqui, caiu quase pela metade nos últimos 5 anos, a tendência é a queda continuar e isso é só o começo de uma longa jornada de transformação.

Na China, a adesão a meios de pagamentos móveis feito por instituições não bancárias, como AliPay e WeChatPay, é de mais de 90% dos usuários de smartphones, contra 32% de usuários de cartões de débito e crédito. Em 2018 foram 530 bilhões de transações (alta de 85% para 2017), equivalente a US$ 30 trilhões (45% acima de 2017). Em dólar, o volume é umas 500 vezes o registrado nos EUA.

Também na China, usando 3 mil variáveis para analisar risco de crédito, a fintech MYbank emprestou US$290 bilhões a 16 milhões de pequenas empresas em 4 anos, num processo que leva 3 minutos, tem 1% de inadimplência e nenhum humano tomando decisões.

Estes dados são só uma pequena mostra da mudança no sistema financeiro global, e nem falamos do potencial de impacto de inovações mais radicais como criptomoedas. Mesmo assim, não deve restar nenhuma dúvida de que há uma transformação global em andamento e que nenhuma faceta do sistema, em nenhum lugar, deixará de ser afetada, por mais proteção que lhe dê o regulador local.

Este, por outro lado, deve ter um olho nos problemas – que sempre vê – e outro nas oportunidades, que quase nunca percebe. Acima de tudo porque, sem fomentar oportunidades de inovação, por vezes com alcance e mercado global, os sistemas financeiros locais – como o brasileiro – correm o risco de serem tão relevantes quanto o número de atores locais de classe global que contém. Aqui, eles são poucos. Muito poucos. É PROFESSOR EXTRAORDINÁRIO DA CESAR.SCHOOL, FUNDADOR E PRESIDENTE DO CONSELHO DO PORTO DIGITAL E CHIEF SCIENTIST NA DIGITALSTRATEGY.COMPANY

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