‘Efeito Uber’ provoca revolução nos estacionamentos
Com menos pessoas usando carros próprios, esses negócios buscam reinvenção com uma série de novos serviços, entre carros compartilhados, bicicletários e prestação de serviços
05/06/2019 | 05h00
Por Fernando Scheller - O Estado de S. Paulo
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Os aplicativos de transporte, como Uber e 99, são apenas o início de uma mudança estrutural na forma de as pessoas se locomoverem em grandes cidades. O ápice deverá ocorrer com a chegada dos carros autônomos, na próxima década. As montadoras já acordaram para a nova realidade e, ao lado de gigantes de tecnologia, começaram a modificar seu próprio modelo de negócio para lucrar pelo uso, e não mais com a venda, de veículos. Segundo especialistas, há outros segmentos que podem ter de se reinventar com as mudanças do setor, como o de estacionamentos.
Embora o setor seja pulverizado no País, há algumas empresas de grande porte que administram estacionamentos. A Estapar, que tem o banco BTG Pactual entre seus sócios e fatura R$ 1,4 bilhão ao ano, já percebeu que o vento das mudanças está mais forte. Por isso, testa uma série de novos serviços para ocupar seus espaços em um cenário de queda de demanda por vagas. Segundo o presidente da Estapar, André Iasi, as vagas individuais para carros podem ser transformadas em pontos de embarque para apps de transporte, bicicletários, oficinas mecânicas e pontos de locação de veículos.
Estacionamentos, como este da Estapar, em São Paulo, vão precisar se reinventar para se adequar aos novos tempos do transporte
Embora Iasi ressalve que ainda levará pelo menos duas décadas para o setor se transformar de verdade – ele argumenta que a frota paulistana de carros não para de crescer e que a infraestrutura de transporte urbano é falha no País –, a Multipark, outra empresa de grande porte do segmento, que administra 280 garagens em 15 Estados, no entanto, vê a mudança chegando em um prazo mais curto.
“O setor de transporte vai sofrer uma disrupção com o carro autônomo”, afirma Mário Coutinho, que hoje atua como consultor de negócios para a Multipark. “O estacionamento vai se tornar um hub de mobilidade. E é algo que está a dez anos de distância, no máximo.”
Sob pressão
Um estudo mostra que os estacionamentos já sentem o efeito dos aplicativos de transporte: levantamento da Fipe, feito a pedido da empresa de transporte 99, aponta que só as viagens realizadas pela companhia liberaram 78 mil vagas de estacionamento em São Paulo por dia. Se o efeito de Uber e outros serviços semelhantes for levado em conta, pode-se chegar a uma conta maior.
Apesar de a frota que circula por São Paulo ter realmente crescido nos últimos dez anos em mais de 2 milhões de veículos, levantamento da Fenabrave (associação de fabricantes automotivas) aponta que a participação das vendas para frotistas praticamente dobrou na última década, atingindo 43% no fim de 2018. Hoje, uma das principais clientelas de locadoras são justamente os motoristas de apps como o Uber, que não usam vagas para estacionar seus veículos.
Para o sócio da PwC e especialista em mobilidade urbana Marcelo Cioffi, os estacionamentos devem sofrer mais com a mudança para carros compartilhados do que as montadoras. “Para as fabricantes, há o desafio da mudança de paradigma. Há cem anos elas vendem veículos a uma concessionária, que repassa o produto ao cliente final a um alto preço”, explica o especialista. “Agora, elas terão de se adaptar a cobrar pelo serviço, um tíquete mais pulverizado. É um desafio, mas pode ser uma mudança benéfica no longo prazo.”
Cioffi diz que o mesmo raciocínio não vale para os estacionamentos: os carros compartilhados tendem a não precisar de vagas porque, ao contrário dos individuais, vão rodar o máximo de tempo possível. “A redução do uso de espaços urbanos para estacionar carros é algo positivo, tanto do ponto de vista do fluxo do trânsito quanto do uso desses espaços para outros fins, como parques”, diz o sócio da consultoria.
A PwC projeta que, por volta de 2030, um terço dos carros vendidos na Europa serão autônomos. Para Cioffi, carros individuais e compartilhados, autônomos e dirigidos por motoristas, vão coexistir por algum tempo – ele crê, porém, que as novas tecnologias passarão a dominar uma fatia cada vez maior. Apesar de ser cético sobre a rapidez da mudança, Iasi, da Estapar, admite que o estacionamento passará a atender mais a empresas do que ao consumidor final.
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