‘O QuintoAndar está em ótima forma’, diz investidor americano da empresa

Ao ‘Estadão’, Kevin Efrusy, da gestora Accel, afirma que a startup imobiliária está forte para encarar o momento de ajustes do setor de tecnologia

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Por Guilherme Guerra
Atualização:

No mês passado, o QuintoAndar demitiu 4% de seus funcionários após ser um dos principais patrocinadores do Big Brother Brasil 22. O movimento foi seguido de desligamentos em outros “unicórnios” (startups avaliadas acima de US$ 1 bilhão), o que acendeu a luz amarela em parte do mercado. Para um dos principais investidores estrangeiros da startup imobiliária, porém, não há motivo para preocupações. 

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Kevin Efrusy, da gestora Accel, diz que o QuintoAndar está em “ótima em forma” e que ajustes de custos fazem parte da rotina. A avaliação vem de alguém que, na América Latina, tem um portfólio de respeito, o que inclui também nomes como Gympass e Nuvemshop. Nem a apreensão global junto ao setor de tecnologia, que vê demissões e desaceleração de projetos em gigantes como Facebook, Netflix e Uber, parece assustar o investidor. 

“Eu não chamaria de bolha, e sim de um “novo ciclo potencial de renovação da tecnologia”, diz ele, que foi investidor do Facebookem 2005, quando a rede social de Mark Zuckerberg estava longe de dominar o mundo. 

Kevin Efrusy foi um dos investidores pioneiros do Facebook Foto: Accel/Reprodução

Nesta semana, Efrusy participou do Brazil at Silicon Valley 2022, evento tem como objetivo aproximar empresários brasileiros das inovações e dos grandes nomes do Vale do Silício. Ele conversou com o Estadão e, além de falar sobre o momento de virada para empresas de tecnologia, avaliou as oportunidades e desafios do ecossistema brasileiro de inovação. Veja abaixo os melhores momentos. 

Estamos em uma nova bolha da tecnologia, como nos anos 2000?

Eu não chamaria de bolha, e sim de um “novo ciclo potencial de renovação da tecnologia”. A telefonia celular e a nuvem estão bastante velhas agora. O iPhone saiu em 2007 e a rede social nasceu em 2004, por exemplo. São tecnologias de mais de duas décadas. As aplicações fáceis sobre elas já foram criadas. E geralmente, nos ciclos, há uma correção até a nova plataforma que será altamente adotada. Mas com o Brasil isso é diferente, porque existem tantas coisas fundamentais para corrigir na economia, trazer eficiência pela digitalização. Há muita oportunidade para coisas básicas no País. De qualquer forma, acredito que estamos em um ponto interessante e não acho que esta seja uma correção breve. 

Quanto tempo deve durar?

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Não sei. Geralmente, quando vimos esses ciclos no passado, demorava cerca de dois anos antes de ser encontrada a nova plataforma. Não sei o que vem por aí. A bolha de tecnologia afetou todos de 2000 a 2002. O Facebook surgiu em 2004 e foi reconhecido como fenômeno em 2006, o iPhone veio em 2007. Então, talvez demore um tempo ou, ainda, as novas plataformas já estejam aqui. Inteligência artificial talvez? Metaverso? Blockchain? 

Como esse cenário afeta o seu trabalho como investidor? O sr. está mais cuidadoso?

Não, sempre fui cuidadoso. Invisto em coisas em estágio inicial. Se eu fosse um investidor de late stage, eu estaria muito mais cuidadoso antes de investir em algo que irá abrir capital. As decisões estão sendo tomadas com base no que deve ser o valuation no futuro. Se uma companhia vai à Bolsa valendo US$ 10 bilhões porque o mercado está fantástico, é possível investir US$ 1 bilhão e fazer muito dinheiro. Agora, se o mercado muda, os múltiplos mudam dramaticamente. Isso traz um impacto enorme para os unicórnios, porque eles vão descobrir que suas avaliações nesse ambiente são uma fração do que eram. E irá haver downrounds (quando uma empresa tem seu valor de mercado reavaliado para baixo), o que é difícil psicologicamente para os empresários. Mas, se você está solucionando um problema fundamental, tem boas métricas econômicas, sabe como ser lucrativo, tem um mercado grande, nada disso importa. Boas companhias vão levantar dinheiro em qualquer cenário em qualquer ponto do ciclo. Tendo a ficar nervoso com essas companhias que precisam de capital barato para sobreviver.

O QuintoAndar fez um grande corte de funcionários. Como o sr. avalia o momento da empresa? 

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O QuintoAndar está em ótima forma, porque é uma startup que sabe exatamente qual é o seu negócio — desde o seu início. Todas as companhias vão fazer algum tipo de redução de custos para continuar saudáveis, mas o QuintoAndar é provavelmente uma das melhores. Seus competidores estão em um cenário muito mais difícil, até onde sei, mas estão em um negócio ligeiramente diferente. Os fundamentos do QuintoAndar, especialmente o negócio de aluguel de imóveis, é fantástico. É uma parte muito resiliente da economia, enquanto outras do setor imobiliário não são. Acredito que companhias de outras partes vão ficar muito, muito feridas. 

Quais os problemas do Brasil mais lhe interessam solucionar atualmente?

Você não irá gostar desta resposta, mas a resposta é “eu não sei”. Vamos lá: não sou brasileiro. Quando as pessoas vêm até mim para me educar sobre o QuintoAndar, por exemplo, eu fico apaixonado. Quando conheci o modelo da startup pelo Gabriel (Braga, fundador e atual CEO da companhia), eu odiei. Não há nada parecido nos Estados Unidos, essa ideia de garantia de aluguel. Mas me convenceram que isso é uma questão no Brasil, porque é difícil conseguir um apartamento, porque necessita de um fiador, locatários não querem alugar para jovens, a experiência não é boa. Mas uma investidora brasileira me convenceu de que é um grande problema no Brasil. Lembro que eu disse que não sabia se isso era um investimento ou uma doação, no sentido de ter meu dinheiro de volta. Mas confiei neles e eles são uma companhia fantástica comandada pelo Gabriel. Eu não sabia nada sobre o problema. Gosto de negócios assim, em que alguém tem de me educar.

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Em termos de inovação, o que o Brasil pode aprender dos Estados Unidos? E vice-versa…

Gosto mais da segunda parte da pergunta. Eu amo como o Brasil tem usado o empreendedorismo para o desenvolvimento da economia. Está trazendo talento de volta, criando empregos e eficiência, transformando a economia de maneiras incríveis. É o país que tem o mais inovador e maior neobanco do mundo (o Nubank). A companhia mais incrível do mercado imobiliário é brasileira, o QuintoAndar. Existe o Gympass, uma startup global que inventou um modelo. Eu espero que o Brasil não aprenda com o Vale do Silício, porque é uma região que perdeu parte do fio da meada. Ainda existem partes que vão muito bem e há ótimas companhias. Mas, na verdade, estou muito animado com a inovação brasileira.

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Agora, o que pode ser aprendido com o Vale do Silício… Às vezes, é preciso importar talento. Basta olhar para quem começa essas companhias: são imigrantes de fora dos EUA. Então, é legal tornar o espaço atrativo para pessoas virem e começarem um negócio. Atualmente, estamos dificultando esse processo, o que é algo estúpido. Mas ser aberto a imigrantes é algo para se aprender. Eu adoraria ver o Brasil fazer mais ao buscar de volta os talentos brasileiros. Mas não seria legal se outras pessoas do mundo se juntassem, talvez de outros mercados emergentes, como América Latina, Sudeste Asiático? É difícil imaginar fazer isso num país com taxas de desemprego tão altas, mas, se são pessoas talentosas, isso seria algo legal.

Falta diversidade no nosso mercado de inovação?

Absolutamente, assim como nos EUA. E adoro que não falamos suficientemente disso. Criamos um programa, chamado de Academia de Liderança da América Latina, no qual o trabalho é buscar pessoas da região. Mais da metade vem do Brasil, de áreas sem privilégios, como favelas e, em breve, do Nordeste. E aí criamos estágios em companhias, como essas sobre as quais falamos, com pessoas talentosas que nunca teriam acesso a esses lugares. A startup Galena faz algo similar também. Mas precisamos fazer muito mais porque, quando olho para os empresários e muitas das companhias em que visito, muita gente ainda se parece conosco. 

*O repórter viajou a convite da Brazil at Silicon Valley

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