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Qual é o perfil de quem trabalha em fundos de venture capital no Brasil?

Homens jovens e em início de carreira são maioria no venture capital, mostra pesquisa da Emerging VC Fellows, nova entidade do setor; meta de grupo é trocar informações, aumentar colaboração e também a diversidade entre profissionais

Por Bruno Capelas
Atualização:

O crescimento do ecossistema de startups brasileiro nos últimos anos não trouxe só oportunidades para quem deseja empreender ou trabalhar nessas empresas. Também permitiu que uma série de novos empregos fossem criados – como o de analistas de venture capital, os responsáveis por analisar centenas de startups e ajudar os sócios, que estão com a mão no dinheiro, a escolher quais apostas valem a pena. A partir de hoje, este grupo de profissionais terá uma associação para trocar informações e experiências, buscar mentoria e atrair novas caras. 

Chamada de Emerging VC Fellows, a iniciativa começou a ser gestada por funcionários de gestoras de venture capital pouco antes da pandemia, mas nasceu de fato em conversas de grupos pelo WhatsApp, já na quarentena. Hoje, o grupo já tem 156 associados, de 60 gestoras – há quem esteja presente em casas que fazem cheques para companhias em estágio inicial, como a Ace, até fundos de alto porte, como o SoftBank. A diversidade, porém, ainda não é uma marca entre os profissionais. 

Troca de experiências e oportunidade de negócios entre diferentes fundos é um dos pilares da Emerging VC Fellows, diz Luiz Fernando Néto Foto: Gabriela Bilo/Estadão

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Segundo dados do grupo cedidos com exclusividade ao Estadão, se fosse feito um retrato desse trabalhador, seria o de um homem, jovem e ainda no início de suas carreiras – 78% dos membros têm menos de dois anos na indústria e dois terços têm entre 18 e 25 anos de idade. Já as mulheres são 27% dos associados do grupo, que também tem um perfil bastante elitizado – quase metade dos membros é formado em Administração de Empresas; 31% do total se graduou na Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP)

“Nosso primeiro passo foi entender quem somos. Existe um certo padrão de onde vem os analistas, mas queremos mudar isso. A diversidade é uma bandeira nossa desde o dia 1”, diz Luiz Fernando Néto, um dos primeiros membros da Emerging VC Fellows. “É importante que a indústria tenha diversidade de pessoas e pensamento, até para acompanhar a evolução do ecossistema como um todo”, diz ele, que é analista de inteligência e operação na Ace. 

Na visão de Diane Zehil, que também faz parte do grupo desde seus primeiros passos, diversidade não é apenas uma bandeira – é também algo que faz os negócios serem melhores. “Pessoas que pensam de forma igual vão tomar decisões iguais sobre investimentos. Com o mesmo viés, é difícil enxergar dores de usuários diferentes, o que pode reduzir oportunidades importantes”, diz ela, que é colega de Néto na Ace, fazendo gestão de portfólio. 

Fluxo

Não é uma coincidência que os dois sejam colegas – uma conversa entre Diane e Luiz com um amigo que trabalhava em outro fundo deu início à inquietação que fez a Emerging VC Fellows existir. “Fizemos uma reunião e percebemos que poderia haver muita oportunidade de impacto caso houvesse uma troca de informações aberta entre as pessoas”, conta Diane. “Trocamos conhecimento de análise, informações sobre empresas, isso é importante para o mercado.” 

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Não que isso não acontecesse antes, mas de maneira informal – como em grupos de WhatsApp fechados. Com a criação da sociedade, espera-se que esse conhecimento fique cristalizado. “A indústria de venture capital é recente no Brasil, são poucas as conexões. No início, sofri com a falta de referências e achei que poderia ter mais colaboração”, diz Mártin Lima, que trabalha na Indicator Capital e se juntou ao Emerging VC Fellows nos seus primeiros dias. 

Uma das principais metas do grupo é a de entender melhor o que cada fundo analisa na hora de escolher uma startup – e perceber que uma empresa rejeitada em uma casa pode se adequar bem à de outra. O grupo também sente que pode ajudar os empreendedores a se preparem para uma rodada de captação, calibrando suas apresentações para investidores. 

Outro pilar do Emerging VC Fellows é a de ampliar a troca de dados e histórias sobre o setor – quem tem mais experiência no mercado, por exemplo, pode ajudar quem acabou de começar a carreira. “Nossa ideia é subir a barra entre os analistas”, diz Néto. “Não é uma iniciativa de uma empresa, é de todos para todos”, afirma ele, que acrescenta ainda que o trabalho da associação é 100% voluntário. 

Diane Zehil, membro do Emerging VC Fellows Foto: Alex Silva/Estadão

Além da panela

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Na visão de Lima, o fato de que a indústria de venture capital ainda é jovem no Brasil permite que o grupo consiga gerar bastante impacto desde o início. “Com a força do nosso grupo, podemos ajudar a trazer diversidade, entrando em contato com faculdades além das queridinhas, como Poli, Insper ou FGV”, diz. 

A iniciativa também já inspirou o surgimento de outros grupos, como o Women in VCs, que conta também com sócias (partners, no jargão do setor) dentro. “Assim como o mercado financeiro, é um setor que ainda tem bastante discriminação, tem poucas mulheres tomando decisões, então é importante ter esse diálogo”, diz Diane. 

Na visão dela, é difícil ainda explicar qual é a vocação que alguém precisa ter para entrar na área – o setor tem profissionais egressos de diferentes disciplinas. “O importante, na minha visão, é ser versátil e ter vontade de querer mudar algo ou criar algo, transitando entre diferentes áreas”, diz. “Até porque num dia você pode ter de falar com um empreendedor de agro, em outro de logística, é importante ter perspectiva geral.” 

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Para Rafael Ribeiro, diretor de operações da Bossa Nova Investimentos, “o principal ponto da associação é mostrar que a profissão existe e sua importância para os negócios, pois são esses profissionais que acabam trazendo retorno financeiro para os fundos.” Segundo o executivo, outro benefício possível surgido do Emerging VC Fellows é o de conectar diferentes regiões do País, aumentando a possibilidade de empreendedores fora do eixo Sul-Sudeste encontrarem investidores. 

Já Felipe Matos, autor do livro 10 Mil Startups e colunista do Estadão, vê que a iniciativa indica o bom momento do cenário brasileiro de startups. “A saúde de um ecossistema pode ser medida por quanto ele é colaborativo. É uma iniciativa que ajuda a acelerar o aprendizado em uma profissão nova”, diz. 

Para ele, a concorrência entre os fundos não será um impeditivo para a cooperação entre os profissionais. “Essa troca de informações já existe entre os gestores, a competição também. Mas o cenário de investimentos permite parcerias, é comum que vários fundos façam aportes juntos, então a colaboração acaba sendo maior que a rivalidade.” 

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