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Startup de bicicletas Yellow é a nova aposta dos milionários da 99

Após criar aplicativo de transporte bilionário e vendê-lo para chinesa Didi, Ariel Lambrecht e Renato Freitas agora querem compartilhar bicicletas em São Paulo

Por Bruno Capelas , Claudia Tozzeto e Mariana Lima
Atualização:
Parceria.Amigos de faculdade, Ariel e Renato criam terceira empresa juntos Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Por quanto tempo você tiraria férias se soubesse que ficou milionário? A resposta seria ‘por poucos dias’, se a pergunta fosse feita hoje ao argentino Ariel Lambrecht e ao brasileiro Renato Freitas. Junto ao empreendedor Paulo Veras, eles criaram o aplicativo de transporte 99 e o venderam em janeiro à gigante chinesa Didi Chuxing por US$ 600 milhões. Com US$ 30 milhões no bolso cada um, eles começaram a trabalhar num novo projeto, revelado na semana passada. É a Yellow, startup que opera um app de compartilhamento de bicicletas e que tem também como sócio o ex-presidente da fabricante Caloi, Eduardo Musa.

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Com o novo aplicativo, eles querem emplacar no Brasil um serviço que virou febre na China e já ganha força nos Estados Unidos. A ideia é simples: por meio do smartphone, a pessoa verifica quais bicicletas estão por perto. Elas podem estar em qualquer lugar, já que não ficam presas a uma estação, como as do Bike Sampa, operado pelo banco Itaú. Basta ir até a bike, destravá-la fotografando um código de barras QR, e sair pedalando. Quando o percurso terminar, a bicicleta pode ser deixada em qualquer lugar e bloqueada via app.

Eles já conseguiram dinheiro para bancar a ideia. Até agora, a startup recebeu US$ 9 milhões em capital semente dos fundos Monashees e Grishin – este último, do bilionário russo Dmitry Grishin. O investimento é um dos maiores já feitos na América Latina em uma startup em estágio inicial.

Terceiro sócio da Yellow, Eduardo Musa já foi presidente da fabricante de bicicletas Caloi Foto: Tiago Queiroz/Estadão

O nerd e o zelador. Três meses parece pouco tempo para tirar uma startup do papel, mas trabalhar muito e rápido são marcas de Lambrecht e Freitas, que se conheceram durante o curso de Engenharia Mecatrônica na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), em meados dos anos 2000. “No último ano da faculdade, criamos nossa primeira empresa juntos”, conta Freitas, sobre o portal de conteúdo universitário Ebah. “Foi o nosso primeiro filho.”

Em 2012, depois que Lambrecht viajou para a Alemanha e usou o aplicativo MyTaxi, os dois amigos resolveram trazer a ideia ao Brasil. Logo, eles conheceram Veras, que se juntaria ao grupo para criar a 99. Hoje, olhando para trás, Veras se lembra da disposição dos dois empreendedores para tornar o projeto realidade.

“O Renato nunca tinha programado para iPhone, mas aprendeu a mexer no software da Apple e escreveu o código do aplicativo da 99 em 72 horas”, conta Veras. “Ele trabalhou três dias e virou duas noites, mas fez o trabalho de uma equipe inteira, o que foi muito bom.”

Aquela não seria a única vez que Freitas viraria noites trabalhando. Uma cena comum para funcionários da 99 ouvidos pelo Estado era chegar pela manhã ao trabalho e encontrar Freitas largado numa rede, dormindo, depois de programar por horas. “Ele ficava para resolver os problemas durante a noite”, conta a engenheira e ex-funcionária da 99 Karina Piva.

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Lambrecht também era figura mais que constante no escritório da empresa, o que lhe rendeu um apelido peculiar: Zelador. “Quando mudamos de escritório pela primeira vez, depois de levantar investimento em 2015, o Ariel resolveu construir todas as mesas sozinho”, conta Marcus Andrade, hoje diretor de operações na 99. “Ele passou um final de semana inteiro serrando madeira e montando cavaletes. Na segunda-feira, estava tudo pronto.”

Para destravar bicicleta, usuário terá de ler código de barras QR com aplicativo da startup Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Sem lugar. Depois de anos de dedicação para fazer a 99 crescer, a empresa ficou mais estruturada e a equipe maior. Lambrecht e Freitas começaram a sentir uma sensação esquisita de que, talvez, o trabalho deles tivesse terminado. “O nosso ciclo na 99 estava acabando”, lembra Freitas. “A empresa estava contratando grandes diretores, com bagagem. Era difícil a gente se encaixar nessa estrutura.”

“Quando o seu filho cresce, você mais atrapalha do que ajuda”, afirma Lambrecht. “Acho que a sensação foi de dever cumprido.”

Antes mesmo da venda para a 99, os dois empreendedores foram fisgados por uma nova ideia ao serem apresentados a Musa. Na época, o executivo estava envolvido com o mercado de capital de risco, depois de deixar a Caloi em 2016. O que ele queria, porém, era empreender. “Fiz a proposta de cofundarem a Yellow comigo porque somaria competências incríveis de quem mais entende de aplicativo de mobilidade urbana no Brasil”, relembra Musa. Lambrecht e Freitas se interessaram, mas foi numa viagem à China que eles se convenceram. “Nós andamos com as bicicletas da Ofo, o primeiro aplicativo de bicicletas sem estação do mundo, e gostamos muito”, conta Freitas. 

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Maratona. Com o desafio de colocar de pé uma nova startup, que pretende distribuir bicicletas pelas calçadas da cidade em viagens por um custo abaixo de R$ 4, os dois amigos arregaçaram as mangas logo depois de vender a 99, em janeiro. As jornadas, quase sempre, superam as 12 horas diárias.

“Tento me policiar para trabalhar menos e me dedicar a outras coisas importantes, como minha família”, diz Freitas, que será pai pela primeira vez em maio. Eles contrataram cerca de 15 pessoas para ajudar até agora – a maioria é de ex-funcionários da 99.

Os desafios que a Yellow têm pela frente são grandes: a falta de infraestrutura adequada para o ciclismo nas principais cidades do Brasil, o desconhecimento das regras do Código de Trânsito Brasileiro e, claro, o vandalismo, são alguns dos principais, segundo os próprios empreendedores.

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A startup desenvolveu sua própria bicicleta como forma de evitar roubos: além de não ter marcha e seus pneus não servirem em outros modelos de bicicleta, ela terá um GPS embutido, o que permitirá o monitoramento em tempo real.

Serão 20 mil bicicletas pelas ruas em São Paulo a partir de julho; talvez 100 mil em várias cidades daqui a dois anos. Como em qualquer startup, o sonho é grande, mas o risco é alto. “Uma vantagem de ter um pouco mais de dinheiro é poder arriscar”, diz Lambrecht. “Se der errado, teremos orgulho de ter tentado mais uma vez.” E juntos.

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