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Startups brasileiras tentam um lugar ao sol do metaverso

Após guinada do Facebook, segmento ganhou novo gás e abriu oportunidades para empresas que criam bens digitais

Foto do author Guilherme Guerra
Por Giovanna Wolf e Guilherme Guerra
Atualização:

Desde outubro passado, quando o Facebook mudou seu nome corporativo para Meta, um dos principais assuntos do mundo da tecnologia tem sido o metaverso – segundo a Bloomberg Intelligence, o setor pode movimentar US$ 800 bilhões até 2024. Além de atrair os olhares de grandes empresas, o conceito, que planeja fazer a ponte entre mundos digitais e o mundo real por meio de realidade virtual (RV) e realidade aumentada (RA), começa a abrir um novo mercado para startups brasileiras.

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Enquanto Facebook, Microsoft e outros titãs do setor pensam no uso mais amplo do conceito, como a construção de universos digitais gigantescos e hardwares de última geração, as nossas startups trabalham em desenvolvimentos mais focados. Uma delas é a paulistana MedRoom, que criou um universo digital para o ensino de Medicina. Fundada em 2016, a empresa foi comprada em novembro de 2020 pelo grupo Ânima Educação.

A startup desenvolveu um software que funciona como um laboratório de anatomia em RV, em que estudantes conseguem interagir virtualmente com partes do corpo humano em 3D – para acessar a plataforma, é preciso usar o dispositivo de realidade virtual do Facebook, chamado de Oculus Quest

“A RV é excelente para a educação. Nunca tivemos uma ferramenta que conseguisse prender tanto a atenção”, afirma Vinicius Gusmão, cofundador e presidente executivo da MedRoom, ao Estadão. “As peças de cadáveres se decompõem, o que atrapalha o aspecto visual e tátil dos órgãos. Com interações digitais, conseguimos colocar um coração batendo na frente dos estudantes, como se fosse de uma pessoa viva”. 

Gusmão, da MedRoom, aposta no poder educacional da tecnologia Foto: Helcio Nagamine/Estadão

Atualmente, a MedRoom oferece o software para 40 instituições de ensino, entre elas Einstein, Estácio e Pontifícia Universidade Católica (PUC) – as escolas pagam uma assinatura anual pela plataforma e são responsáveis por comprar as estações de realidade virtual. Além da experiência com os óculos, a startup disponibiliza uma versão mais restrita do corpo humano virtual em um app e um site. 

Outro uso do metaverso é no varejo. A startup R2U, por exemplo, oferece uma ferramenta de RA que gera objetos digitais em 3D – a solução é usada principalmente na área de decoração. Com o recurso, que funciona pelo navegador do celular, o consumidor consegue simular como o produto desejado, como um sofá ou uma cadeira, ficaria no ambiente onde ele seria instalado. Sediada em São Paulo, a R2U atende hoje 38 varejistas, entre elas Leroy Merlin, Mobly e Electrolux – em novembro de 2020, a startup captou US$ 800 mil em uma rodada de investimentos liderada pela firma de venture capital Canary.

A startup também vai ajudar varejistas a criarem lojas em um universo virtual, digitalizando seus produtos. “Fazemos itens em 3D para vários sistemas há muitos anos. Temos todo o potencial para sermos os arquitetos do metaverso”, diz Caio Jahara, cofundador e presidente executivo da R2U. A empresa está desenvolvendo uma plataforma de metaverso que deve ser lançada em abril, em que consumidores poderão comprar os produtos das marcas por meio de NFTs (formato de arquivo único que dá ao seu detentor a propriedade digital sobre o item na internet). 

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Jahara conta que os planos da startup foram impulsionados após a mudança de nome do Facebook. “Uma das maiores empresas do mundo falou que o metaverso é a prioridade. Depois disso, temos sentido uma demanda gigantesca dos nossos próprios clientes pelo assunto”. 

Startup R2Uvai ajudar varejistas a criarem lojas em um universo virtual, digitalizando seus produtos Foto: R2U

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O mercado publicitário é um dos que mais demonstrou interesse pelo metaverso – o que deu um gás nas startups que atendem o setor. É o caso da Biobots, que cria avatares, como influenciadores virtuais, para marcas ou pessoas. Um dos projetos da empresa, que oficializou sua chegada ao mercado em novembro passado, é a Satiko, avatar da apresentadora Sabrina Sato

“Existem vários aplicativos para criar avatares. A Biobots, porém, faz um boneco exclusivo. Temos um trabalho quase manual de concepção como se fosse uma produção de uma animação para a Disney”, explica Ricardo Tavares, presidente executivo da Biobots, que, além do Brasil, pretende atender clientes em Miami e Portugal. A ideia é que os avatares possam ser usados em diferentes plataformas, desde redes sociais até servidores de metaverso. 

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Também na área da publicidade, a carioca Vitulo, nascida em abril de 2021, usa tecnologia de realidade aumentada para trazer mais interação às marcas, como em filtros de Instagram – o recurso, mais conhecido por ter se popularizado no jogo Pokémon Go e no aplicativo Snapchat, é uma das aplicações mais comuns do metaverso, já que exige apenas o uso de um smartphone. 

A startup já visualiza novos usos para a realidade aumentada do futuro, inserida nesse ambiente digital conectado: o principal é o conceito de “moda digital”, em que o usuário possui réplicas digitais de suas roupas (para usar em games, por exemplo). Outra possibilidade é utilizar as câmeras cada vez mais potentes nos aparelhos para experimentar novas roupas, sem sair de casa, com precisão similar à de um provador de loja. 

“Será uma grande quebra de paradigma. Essa nova camada cria um novo segmento de mercado”, afirma Pedro Cormann, cofundador da Vitulo.

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Modismo e oportunidades

Na visão de Alexandre Pompeu, gerente de negócios e inovação da consultoria ACE Cortex, a guinada para o metaverso é um caminho sem volta. “É um movimento que vai atingir 100% das corporações e virá em conjunto com as startups”, afirma. Para ele, da mesma forma que muitas empresas estão focadas hoje em digitalizar as operações de outras companhias – criando e otimizando sites, por exemplo –, startups ajudarão a conduzir a migração para o metaverso. 

Dentro disso, deve haver um nicho de atuação para as empresas de tecnologia iniciantes. A produção de equipamentos, como óculos de realidade virtual, talvez não engate por aqui. “Faz mais sentido para as startups deixarem o hardware nas mãos das gigantes de tecnologia e focarem em software. O Brasil não fabrica celular competitivo e mesmo assim é um país relevante que exporta diversas aplicações para o mundo”, diz Pompeu.

Mesmo no software, porém, surgirão desafios, tendo em vista a complexidade tecnológica do metaverso, afirma Felipe Matos, presidente da Associação Brasileira de Startups (ABStartups) e colunista do Estadão. “O País tem dificuldade na produção de tecnologia de ponta, como os algoritmos e plataformas de base sobre os quais o metaverso irá rodar. Talvez o potencial maior esteja na indústria criativa: o metaverso precisará de conteúdo, e nisso o País é muito bom”, diz. 

Apesar dos entraves, o metaverso já está no radar dos fundos de capital de risco brasileiros. “Ainda é muito cedo. Não sabemos se vai existir um grande metaverso ou vários metaversos. Mas sabemos que a oportunidade de ter uma economia digital, com ativos financeiros nesses universos virtuais, traz um valor”, diz Renato Valente, sócio da Iporanga Ventures.

A Terracota Ventures, firma de capital de risco focada em negócios de tecnologia para construção e mercado imobiliário, já enxerga aplicações específicas. “Será que vender um imóvel no mundo virtual é tão diferente do processo no mundo real? As startups que tiverem esse olhar talvez saiam na frente”, afirma Bruno Loreto, sócio da Terracotta Ventures.

Mas o pé ainda está no chão. “No curto prazo, há risco de ser um modismo, porque é uma onda nova que está em evidência. Com o tempo, esses negócios vão mostrar se são rentáveis ou não”, diz Loreto. 

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